Os galhos chacoalhavam e belas
folhas do abacateiro caiam com o impulso de força maior, mãe natureza que tudo
acalenta levando suavemente a folha ao chão, e essa predominância azul celeste
que no firmamento parece nos olhar de longe, era sobre isso que eu meditava
deitada por entre as folhas outonais no interior de São Paulo alguns anos
atrás, quando uma borboleta linda de tom alaranjado e preto pairando sem peso
Sob o ar rodopiando em seu
balé natural e em uma tarde trazia a brisa suave
E sob o peso do meu corpo
o crunch crunch das folhas secas sendo esmagada, e eu maravilhada a observar
uma singela borboleta que sabe se lá quando deixara de ser crisálida e sabe se
lá quando deixaria da existir, um ciclo era isso que eu pensava
Será que meu ciclo de dor
se intensifica ou interrompe, eu pensava
quando ela tão suave pousara sob minha pele e aquela tromba que ela usa para se
alimentar fazendo cócegas a tatear minha pela áspera demais para criatura tão
frágil, e apesar de nada dizer, dizia muito, sua metamorfose me fazia crer em
uma fé maior, em um ser onipotente, onipresente que feito sentinela vela por
cada alma milenar e com esse estado de espírito lembro das palavras que saíram
da minha garganta primeiro um sussurro e depois com mais veemência.
Eu quero asas! Eu quero
asas!
Não sei quanto tempo
ficara ali paralisada em uma antecipação que meu sexto sentido dizia que tudo
mudaria, que a vida gira 360 graus, que muda e volta para o mesmo lugar e que nós inevitavelmente amadurecemos com as
dores, e marcas que cada dia trás, Naquela época eu já sabia que tudo o cheiro
de terra, o aroma dos eucaliptos, o lago povoado por garças, lontras e
capivaras, os troncos, poleiro matutino natural do bem-te-vi que pela manhã e
depois da chuva vinha cantar, do tico-tico, do corruira que fazendo seu ninho vinha nos agraciar com
sua pequenez, que cada engrenagem familiar mudaria, que o pomar no fundo da
casa onde durante anos eu colhera laranjas em março, jabuticaba em setembro,
mangas em dezembro, acerola o ano tudo
isso ficaria pra trás junto com o velho pé de jatobá, que carcomido ainda resistia a força da idade,
amigo que agüentará tantos anos, balanços e crianças, adolescentes e velhos
tomarem impulso e confiarem e um sua magnífica estrutura.
A memória hoje não se
esquece do solo arenoso de pedras brancas e da vegetação daninha, do perigo
iminente de insetos, cobras e lagartos que tanto amedrontava as pessoas vindas
da capital, menos eu a garota que chegara uma tarde de setembro em meados de 94
e partiria em meados de janeiro de 2014, vinte anos de amor e respeito por um
solo que não me fora herdado, mas que sempre será legado em minha vivida
memória e meu eterno e agradecido coração.
Eu fora a filha da
floresta por vinte maravilhosos anos, aprendera tanto com a natureza, havia
tido animais tais qual mula, cavalo, vaca, cachorro, gato, pato, ganso, galinha,
pássaro preto, sabia, gavião e ate cuidado de um beija-flor por uma noite e
depois o havia deixado partir, com o mesmo amor a mesma paixão que durante anos
fora parte de minha extensa historia, deitada na velha rede sempre na companhia
de um ótimo livro, ouvindo o som da minha juventude, a graça do meu desabrochar
e me tornar parte de um todo, e essas lembranças serão sempre trazidas do meu
subconsciente no momento certo para me levar de volta a verdade, sobre quem eu
era, e sobre quem eu me tornara, uma mulher hoje no auge dos seus belos 35,
munida de sonhos que se materializam tal qual a força da fé, essa mulher que
tantos autos e baixos tenha tido o no esplendor da maturidade almeja coisas
simples como paz de espírito, em um espírito livre que almeja o mundo, a arte o
belo, cheia de historias pra contar e sonhos em potencial.